quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Trabalho e amamentação

Sempre gostei de trabalhar. Sempre fiz o que gosto. E isso sempre me fez bem. Mesmo com filhos, sempre me imaginei trabalhando. Quando engravidei do Vitor, fazia planos, ainda que bem utópicos, de trabalhar apenas meio período.
Na época, trabalhava como coordenadora pedagógica no Oficina na Piscina, com polo aquático. O projeto era dependente de um convênio com a prefeitura que se encerraria no final daquele ano. Pelas nossas condições, isso significaria ser desligada do projeto. No final do ano, também terminaria um trabalho de consultoria. Lamentações à parte, pensava que seria uma oportunidade para fazer meu plano funcionar.
Até que...

Um processo seletivo no SESI apareceu na minha frente... Especialista em Esporte, 40h, bom salário, perto de casa, instituição sólida. Com exceção da carga horária, era tudo o que eu procurava. Fiquei inquieta, confusa... Não sabia se prestava... Depois de muito matutar, resolvi prestar. "Vai que eu fico em lista de espera e sou chamada depois de 6 meses ou 1 ano?". Pois bem, fiz a primeira prova com 39 semanas de gestação. Passei e fiz a última etapa com o Vitor com 17 dias de vida... Passei e por volta do dia 20 de dezembro, fui contatada pelo RH, questionando sobre meu interesse na vaga, a iniciar em 06/01 - Vitor com 2 meses de vida. Ao telefone, eu respondi: "Claaaaaaaaarooooo!" E aproveitei para colher informações, pensando na minha condição: essa data de início é inadiável? E minha licença? E minhas condições de trabalho como lactante? Dúvidas essas (e muitas outras) esclarecidas no dia da admissão. Fora do telefone, desesperei-me. Comecei a chorar, acreditando e berrando que não seria possível, que não daria pra aceitar, que teria que abrir mão.
O Luiz ao meu lado, tranquilizou-me e começamos a traçar todo o plano para que eu de fato aceitasse a vaga, considerando que:
1. seria uma oportunidade muito importante profissionalmente pra mim;
2. seria muito importante pra nossa casa também;
3. meus filhos precisavam de mim, mas principalmente, o Vitor, pela importância da mãe e da amamentação.
O plano foi o seguinte:
a) enquanto eu não estivesse em casa, o Vitor ficaria com o Luiz. Não tinha nenhum temor com o fato do pai ficar com ele. Mas sim, de eu não ficar... Mas tranquilizava-me o fato de, como disse uma amiga, o Luiz era a segunda melhor pessoa no mundo pra cuidar dele <3. Incluso nos cuidados triviais, o Luiz o alimentaria no meio da manhã e no meio da tarde. Sendo assim, eu teria que:
b) tirar leite duas vezes por dia: de manhã e à tarde, na pausa do "cafezinho". Para isso, eu teria que ser muuuuuito ágil e assim seria necessário:
c) arranjar uma máquina ninja de tirar leite. Facebook em ação, encontrei alguns amigos que estavam nos EUA dispostos a ajudar. Bruninho foi o responsável por trazer uma bomba elétrica dupla da Medela (Pump in Style), que salvou a minha vida. Enquanto ela não chegava, aluguei uma (Leite Fácil) e aproveitei para tirar todas as dúvidas.
d) completar a quantidade de leite necessária, tirando leite de manhã, antes de sair de casa, enquanto o Vitor mamava. Como ele já dormia a noite toda (ufa!!!), os peitos estavam bem cheios de leite e ele satisfazia-se com um peito só, largando-o ao adormecer.
d) cuidar do armazenamento do leite. Na mesma Leite Fácil, havia aluguel de mini-geladeira. Foi tão eficiente e teve sua função expandida para iogurtes, sucos e afins, que resolvi comprar uma também.
e) chegar mais tarde e sair mais cedo do trabalho. Não, não é folga. É um direito da lactante: 1 hora por dia por conta da amamentação (e é muito pouco!). Fiz esse arranjo para poder amamentar o Vitor com tranquilidade antes de sair de casa e chegar em casa a tempo do Luiz sair de casa para o trabalho.
f) (o item mais ninja do plano) Amamentar o Vitor no horário de almoço. O intervalo era (e é) de 1 hora. Minha casa é perto, mas não o suficiente para ir, voltar, alimentar o Vitor e a mim também. Sendo assim, o Luiz ia todos os dias almoçar comigo e durante nosso almoço, eu revia o pequeno e o amamentava. Pausa dramática: TODOS os dias. Essa foi a rotina por 4 meses, até que ele completasse 6 meses. Clap, clap, clap para o Luiz.
g) ampliar o horário do Felipe na escola para que ele pudesse almoçar lá.

Poucas vezes vi um plano entrar tão perfeitamente em ação. Nossa vontade era tanta e cuidamos tanto do plano quanto da execução, que deu tudo certo!

Não acho uma história bonita (inclusive, pode ser interpretada como uma história muito feia: "Creeeedoo! Largou o filho pra trabalhaaarrr"), mas sem dúvida, foi um esforço muito bonito da nossa parte para conciliar as coisas, sem deixar de cumprir nosso papel de pai e mãe.

Há quem pense: "que loooucaaaa!!! Ficar tirando leiteeeee! Por que não deu mamadeira com fórmula de leite em pó infantil?!?!?!?". Explico: meu pensamento é que é meu DEVER fazer o melhor possível para o meu filho. Nesse melhor incluo a amamentação. Prolongada. E exclusiva até os 6 meses de idade. Quis trabalhar?! Então, me virei pra cumprir esse meu DEVER. Além disso, não consigo conceber a ideia de oferecer leite "morto" (foi mal, gente, mas não consigo mesmo...) pro meu filho... lembrando que não tenho nenhum impedimento fisiológico, nem o Vitor, que me obrigue a adotar a fórmula.

Foi muito bom falar com o Luiz sobre isso, um tempo depois, elogiando-o e agradecendo-o por todo o esforço dele, pois não vejo ser muito comum, e vê-lo praticamente recusar os louros e afirmar que simplesmente ele fez o que devia ser feito.

Depois dos 6 meses, o Vitor foi para o berçário e começou a se alimentar de outros alimentos. Por 2 meses ainda, fiz a extração de leite. Depois disso, passei a amamentá-lo de manhã e à noite. E assim está até hoje, com 1 ano e 2 meses.

Desejo que as instituições apoiem as lactantes (um agradecimento especial a minha equipe de trabalho por todo o acolhimento e compreensão) e que as leis ofereçam cada vez mais condições para que isso aconteça.

Mas acima de tudo, espero encorajar aquelas que acreditam que o retorno ao trabalho fora de casa é o fim da amamentação.